É bom ser cão para não ter que ouvir conselhos dos homens. É certo que levo um monte de chutes por aí, mas às vezes deve ser melhor receber um chute do que um conselho. Não porque os conselhos sejam ruins por si próprios, mas é que aqui na cidade o tema deles parece não mudar, parece o mesmo lenga-lenga de sempre, a mesma piririmprolopopéia-discafatice enfadonha. Deus me guarde dos conselhos! Deus me guarde das conversas pra boi enriquecer! Falo isso porque outro dia encontrei um jovem que tem sido confundido com uma lata de despejar verbos no imperativo e no futuro do pretérito. O pobre coitado tem sido alvejado por conselhos, melhor seria dizer pelo mesmo conselho repetidamente. Ontem , quando ele se sentou ao meu lado, um pouco abatido de tanta paulada palavreada, veio uma canção do dia e me sussurrou assim:
Os sonhos que costumava ter antes
Hoje eu já não os alimento mais
Em troca de agarrar os instantes
Que se vão como os barcos vão do cais
Se a grandeza é o tema inaugural
Dum sonho emancipado da madrugada
Então para ele deve haver um canal
Em cuja foz há uma vida frustrada
Realizar um sonho de ser e ter
É o que deveria buscar na minha idade
Com todas as forças de que disponho
Mas um algo insiste em me dizer:
O sonho não se torna realidade
Numa realidade feita de sonho